Há cinquenta anos confiamos à SWIFT a corda que puxa os pagamentos internacionais; agora ela anuncia um ledger próprio com a ConsenSys para permitir transações cross‑border instantâneas. É uma notícia técnica, mas tem consequências humanas.
O anúncio diz que o objetivo é criar um livro-razão compartilhado, pensado para interoperabilidade e conformidade. SWIFT já prototipou essa ideia com mais de 30 instituições — não é vaporware, é uma aposta institucional. Mas chamar isso de “blockchain” não anula decisões políticas: trata‑se muito provavelmente de um ledger permissionado, governado por regras, portas de acesso e contratos entre atores poderosos.
O ponto polêmico é simples: quando transferimos a autoridade que valida pagamentos de bancos e reguladores para um software operado por um consórcio, mudamos quem carrega o risco e quem presta contas. O ponto é sobre onde colocamos responsabilidade quando algo dá errado. Sistemas centralizados com fachada distribuída apenas deslocam pontos de falha e confusão sobre responsabilização.
Há precedentes úteis: iniciativas de tokenização e projetos de pagamentos instantâneos mostraram ganhos de velocidade, mas também dificuldades de governança e interoperabilidade entre jurisdições. A lição prática vem do campo da arquitetura de sistemas: performance sem observabilidade e regras claras vira desastre. Do lado humano, a lição é antiga — confiança precisa de clareza sobre quem responde quando a conta chega.
Se sua empresa, time ou país for convidado a integrar um ledger desses, pergunte além do marketing: quem decide as regras, quem audita o código, quem tem poder de reversão, qual o plano de crise e como a solução interage com leis locais? Tecnologia cria possibilidades; responsabilidade exige escolha consciente.
Fontes: Swift to Add Blockchain-Based Ledger to its Own Infrastructure (Finovate)